VITAMINA DE AÇAÍ

Nelson era um menino magrinho, fraco e cheio de complexos. Aos 14 anos invejava os demais adolescentes de sua idade que já tinham altura e tamanho de homem. Sua voz apenas há poucos meses havia engrossado. A altura mudava pouco ao longo dos anos: cadê a espichada que todo mundo falava? Apesar de bela aparência, as meninas de sua idade nem o olhavam e as mais novas ainda não pensavam em namorar. Ele era o estranho no ninho, o excluído, o sofredor de bullying. Seu sonho era ser goleiro na equipe de handball da escola mas, tendo em vista sua baixa estatura, nem cogitava candidatar-se à vaga. Começou a estudar muito e tornou-se o melhor aluno da turma, mas só atraía nerds chatas e gordas, que ele jamais pensaria em beijar, ainda que fosse um selinho. Vivia chorando trancado em seu quarto até que um dia, quando voltava da aula de inglês, o cartaz miraculoso apareceu na sua frente, exposto em uma propaganda da loja de suplementos alimentares do bairro: “ vitamina de açaí – adquira músculos e melhore sua saúde”.

Um sorriso brotou em seus lábios e ele praticamente jogou-se dentro da loja, quase voando de tanta felicidade. O atendente bonito e sarado disse que a fórmula não tinha qualquer contraindicação: “É só jogar uma colher de sopa dentro do leite desnatado. Tome um copo da mistura à noite, antes de dormir, e de manhã ao acordar. Em poucos meses seu físico será outro. Além do mais, os nutrientes aqui encontrados são a melhor composição alimentar possível.”

Nelson comprou logo duas caixas da vitamina e voltou todo feliz pra casa, dando pulinhos de felicidade! E realmente aquilo funcionou: crescer ele não cresceu, mas adquiriu músculos invejáveis.

“Agora, o que faço pra crescer?”, pensou ele. Que voltou à loja, encostando a bela vendedora na parede: “ Oh, minha linda! Temos algum suplemento para, digamos assim, além de sarado e bonito, eu ficar alguns centímetros mais..... alto?” A moça olhou para um lado, olhou para o outro e, quase cochichando: “Tenho algo novo em nossos estoques. Minutinho.” Aqueles minutinhos foram uma eternidade para Nelson, mas a bela moça voltou com um pote preto enorme, cheio de cápsulas amarelas. Um pouco caro, mas se tudo aquilo que estivesse escrito no rótulo fosse verdade, em pouco tempo estaria da altura de um rapaz normal de 14 anos.

- Quantos anos você tem?

Ele hesitou em responder. Ela, pensando na comissão......

- Toma, leva. Eu nunca te vendi isso, hein?

Que maravilha! Que cápsulas milagrosas! Nelson começou a crescer de forma surpreendente e iniciou o segundo grau como um dos caras mais cortejados pelas gatas da escola. Virou goleiro da equipe de handball. Seu rendimento escolar caiu, mas quem ligava pra isso? As meninas o disputavam ferrenhamente nas festinhas. Com o tempo notou que algo de muito errado estava acontecendo: toda vez que ia ao banheiro, suas fezes saíam de cor muito estranha, era tipo um amarelo florescente, exatamente como o das pílulas do pote preto gigante, que ele comprava todo mês escondido. O pior de tudo era o cheiro de enxofre. Em pouco tempo a sua pele começou a ficar do mesmo tom de amarelo das fezes e, a situação que já tinha sido ruim no passado, tornava-se pior: baixinhos muitos são, mas amarelo sem ser japonês ou coreano, só ele.

É óbvio que as meninas começaram a desaparecer; e seus pais a se apavorar!

Sua mãe o obrigou a fazer uma bateria de exames e no final das contas descobriu-se que ele estava intoxicado por uma diversidade impressionante de elementos químicos, que jamais deveriam ter adentrado o corpo de um ser humano.

“Não sei se quem te vendeu isso contou, mas este medicamento estava há meses encostado nessas lojinhas de suplemento alimentar que tem por aí, devido aos efeitos colaterais. Inclusive soube que mês passado foi banido do mercado americano, por causa do terrível odor que seus consumidores passaram a ter. Pelo menos você só ficou amarelo e não fedorento.” ,disse o médico, tentando controlar o riso.

Nelson sentia-se muito mal. Além da vergonha e humilhação que passou diante de seus pais e colegas de escola, em pouco tempo perdeu os atributos físicos que havia conquistado: a cor amarela demorou meses pra sair, o corpo sarado já era e, a altura, bom a altura ele conseguiu manter, ao menos não encolheu.

Nelson matriculou-se em uma academia de musculação e passou a exercitar-se todos os dias. De pouco em pouco a vergonha foi passando, os amigos foram esquecendo e seus pais também, as notas voltaram a aumentar, seu físico foi melhorando gradativamente, conheceu Monique, uma francesa de Lyon que fazia intercâmbio na escola; e tudo foi voltando ao seu devido lugar.

“Apressado como cru e quente”, dizia sua mãe, alguns anos depois, quando a história era retirada do arquivo. E Nelson, tendo em vista o trauma, passou a alimentar-se da forma mais natural possível. Formou-se em Nutrição e depois Farmácia, escreveu vários livros sobre o assunto, transformou aquele limão numa bela limonada.